Eles não eram oito e sim nove. O nome não era só Titãs e sim Titãs do Iê Iê. A banda nada mais era que um grupo de amigos reunidos em torno de uma ideia que ainda não estava em prática. Também tinha atitude, algumas músicas e figurino. O que faltava estava prestes a acontecer.
O "Cabeça Dinossauro" na minha opinião é um álbum que não é só um álbum de rock,que vc pára pra escutar e fica horas e horas ali prestando atenção nas letras.Ele é um disco em que os Titãs usufrem das canções pra jogar as emoções e despacha a raiva,vomitando o que sentem pra cima da ditadura e das organizações criminosas e hipócritas,pra ser mais objetivo...uma ânsia de vômito em cima de heresia e indignação,total e parcial.
Vivo hj sob uma emoção que jogo fora quando ouço esse disco e pra ser mais objetivo,calo a boca de gente babaca e imbecil,através dele.E quando ouço o disco,agitado,me acalmo!
Ele é um sossega - leão pra pessoas nervosinhas...
Assim que o "Cabeça Dinossauro" foi lançado,todos que viam o programa de Flávio Cavalcanti,se chocaram ao ver o disco sendo quebrado e pisado em rede nacional pelo apresentador e sendo linchado e denominado o lixo do país...
Com “Cabeça Dinossauro” os Titãs lançam disco que une e confronta barbárie e civilização
Por Marcos Augusto Gonçalves
A tribo tem oito guerreiros e está em pé de festa e de guerra. Batucam e gritam. Os dinossauros descem dos viadutos e se escondem nos edifícios. Os ex-Titãs do Iê Iê – que circulavam pelos porões e palcos do underground paulistano – os atuais Titãs que ficaram conhecidos nacionalmente por músicas como “Sonífera Ilha” e “Televisão”, lançam esta semana “Cabeça Dinossauro”, terceiro LP do grupo.
Inspirada num canto do Xingu, a pulsação primitiva e tribal da faixa título abre o disco e mostra o pau. Depois de “Cabeça Dinossauro” não haverá trégua.Ao contrário dos dois primeiros LPs, não se ouvirá refrescos do tipo “Insensível” – que tentou puxar o último disco – ou mesmo “Sonífera”, o primeiro sucesso. Prevaleceu a linha de “Massacre” e de “Pavimentação”,músicas de pulso forte que não chegaram as rádios, mas encheram de energia titânia o LP “Televisão”.
Grande Desafio – “Nós não passamos ainda o clima e a força das apresentações ao vivo”, diz Arnaldo Antunes, 25, compositor e um dos vocalistas do grupo. “Mas dessa vez conseguimos um resultado que nos satisfez”, emenda Sérgio Britto, 26, igualmente cantor e compositor. Conseguir unir os oito em torno de umproduto final que não ficasse distante do espírito e da força das apresentações em show foi o grande desafio,desde que a insatisfação com o resultado de “Televisão” – que consideram mal mixado e aquém do projeto inicial – colocou em risco a própria permanência dos Titãs.
Não é um acidente, portanto, que “Cabeça Dinossauro” manifeste uma atitude guerreira, tribal, original. Para usar um lugar comum, os Titãs tiveram uma forte preocupação com uma selvagem volta às origens. As músicas são cantadas em volume alto, são gritadas mesmo, um pouco à maneira punk, um pouco a maneira funk. E o próprio repertório reencontrou canções muito antigas, compostas quando os oito amigos ainda não pensavam em gravar um LP.
É o caso, por exemplo, de “Bichos Escrotos”, de Paulo Miklos, Arnaldo e Nando. “Ela foi composta no intervalo de uma gravação de uma fita”, lembra Paulo. Foi um sucesso curtido como um “cult” pelas primeiras miniplateias dos Titãs, há cinco anos atrás. “Nós nos reidentificamos com ela”, diz Nando. “Bichos Escrotos” ficou fora de outros discos porque, segundo Nando, havia um trauma quanto a melhor forma de arranjá-la pra ser apresentada”. O trauma ficou ultrapassado por um arranjo que os oito consideram “perfeito”.
Censura – Mas a censura não achou muita graça na escatologia e proibiu a divulgação em rádio e TV.
Outra letra que ficou ameaçada, mas acabou sendo liberada foi a de “Igreja”, do próprio Nando. Afinada com o clima fortedo disco, a letra fala de uma profunda recusa às mitologias do catolicismo: “Eu não gosto de padre / eu não gosto de madre / eu não gosto de frei / eu não gosto de bispo / eu não gosto de Cristo / eu não digo amém”.
Mas os Titãs não ficaram por aí. Além da vetusta Igreja, outras instituições da Ordem são bombardeadas pela cabeça do dinossauro: a família e a polícia, título de duas músicas. Em “Família”, de Arnaldo Antunes e Toni Bellotto, a paranóia da vida caseira é ironizada: “A mãe morre de medo debarata / o pai vive com medo de ladrão / jogaram inseticida pela casa / botaram um cadeado no portão”. Em “Polícia”, de Bellotto, a mesma intenção demolidora.
As letras, como se vê, são fortes. E muito valorizadas pelo grupo como parte orgânica da composição: “O português continua tendo uma grande importância para o nosso som, a letra é fundamental”, diz Branco Mello.
As músicas e os arranjos não ficam muito atrás. Auxiliados por Liminha, produtor de nove entre dez LPs bem sucedidos na área de rock,os Titãs conseguiram produzir uma convincente massa sonora, que passeia pelo rock, pelo funk e pelo reggae sem, no entanto, perder o vigor. “Ao contrário de muitos grupos, não fazemos caricatura de reggae ou caricatura de funk. Há uma originalidade, uma veracidade”, diz Arnaldo.
Mais ainda, os Titãs acreditam que estão levando para o público um trabalho original, ao contrário da média das bandas brasileiras, que não conseguem dissimular suas relações com as matizes europeias e norte-americanas. O próprio fato de apresentarem um canto gritado é valorizado: “Isso é uma coisa que não é forte na tradição das bandas de rock e da própria música popular brasileira”, diz Britto.
Aparentemente fazem um canto anti - João Gilberto. Para usar uma expressão do crítico e professor de literatura Paulo Miguel Wisnick, rasgam a retícula da voz. Mas Arnaldo e Britto embora reconheçam a radical diferença com o clima “cool” de João, descobrem uma afinidade: o cantar gritado dos Titãs – que não tem nada a ver com o canto “expressionista” – estabelece com as canções e com as letras uma intimidade semelhante com a que João obtém em seu banquinho e violão. “João Gilberto usa a fala, nós usamos o grito, mas nos dois casos há uma relação forte com o coloquial”, diz Britto.
Selvageria – Mas indiscutivelmente, a marca do disco é a tentativa de trabalhar com a barbárie contemporânea, sugerindo relações com a selvageria ancestral. Além de “Cabeça Dinossauro”, “AA UU” – que já toca no rádio – é faixa mais que o grupo considera mais tamente afinada com a idéia do disco. (NOTA: o erro de edição e digitação está na matéria original).
“As duas são dois comentários sobre a animalização do homem civilizado, mas aliadas a uma certa sofisticação”, diz Britto. A própria capa do disco – duas gravuras de Leonardo da Vinci – expressa os pólos em jogo: barbárie e civilização, cabeça e dinossauro. “É uma dualidade que degrada e redime”, resume Britto.
Texto escrito por Sérgio Britto a respeito de Cabeça Dinossauro:
"Embora possa parecer, Cabeça Dinossauro não foi propriamente uma mudança de rumo, uma “guinada radical” na nossa maneira de pensar e fazer música.
Foi, isso sim, fruto de algo que já vinha acontecendo há algum tempo. Por exemplo : “Bichos Escrotos” é anterior à gravação do nosso primeiro disco (Titãs, 1984), que só não gravamos naquela ocasião por que a censura não permitiu. No disco que antecede o “Cabeça” (Televisão, 1985) a faixa título, “Massacre”, “Pavimentação” e “Autonomia” já apontavam também para essa direção. “Babi índio” e “Pule “, do primeiro disco, se tivessem sido gravadas com um pouco mais de qualidade, também poderiam ser vistas desse modo.
Fazer um disco com uma sonoridade e um repertório mais pesado era um desejo antigo de alguns de nós que aos poucos contaminou todo mundo. A prisão do Arnaldo e do Tony (NR: por porte de heroína) e, conseqüentemente, o relativo fracasso de Televisão são fatores extra-musical que naquele momento talvez também tenham contribuído para essa virada.
Fizemos o disco num tempo relativamente curto: um mês para gravar e mixar. Em duas semanas já estava quase tudo pronto. As canções, os arranjos e até mesmo o formato das músicas já estavam definidos muito antes de entrarmos em estúdio. A primeira faixa a ser gravada foi “AAUU”: já tocávamos a música em shows e o arranjo estava muito bem resolvido. A última foi “O Que” e foi também a que mais deu trabalho. O arranjo mudou totalmente e o Liminha teve participação decisiva: programou a bateria eletrônica, sugeriu a linha de baixo, tocou guitarra e deixou a gente fazendo uma “Jam” interminavel durante dois dias até a chegarmos ao resultado final. Aquilo abriu um novo horizonte para nós e nos colocou em contato com elementos que iríamos explorar bastante nos anos seguintes.
Este disco, com certeza, se não é o melhor, é um dos melhores que fizemos. Só comparável a Õ Blésq Blom e Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas.
Apesar disso não me atrevo a apontar nenhuma banda que pareça ter sido diretamente influenciada por ele. Em contrapartida, Õ Blésq Blom, se não influenciou, ao menos antecipou toda a onda do Mangue Beat e a mistura de MPB e música nordestina com elemetos de rock e programações eletrônicas.
Algumas curiosidades
- Os acetatos com os esboços do Leonardo da Vinci que estão na capa e na contra capa do disco vieram diretamente do museu Louvre, trazidos por um amigo de meu pai. Antes disso, o que tínhamos eram reproduções pequenas e sem qualidade suficiente para viabilizar o projeto gráfico. As primeiras 30 mil cópias do disco foram feitas em um papel fosco e poroso muito mais caro que o normal. Generosidade doAndré Midani, então presidente da Warner, que nos deu total apoio antes, durante e depois da gravação atendendo a tudo o que pedíamos.
- A percussão na faixa “Cabeça Dinossauro” foi Liminha que tocou. Depois de várias tentativas mais elaboradas, ele começou a improvisar - tocando nas paredes, no chão e nas colunas do estúdio - numa espécie de transe. Assim que ele acabou, todo mundo disse imediatamente: “é isso aí, do caralho!!”.
- Gravei a voz solo de “Polícia” no primeiro take, enquanto Liminha conversava sobre pesca submarina com Evandro Mesquita (talvez isso tenha me ajudado a ficar mais puto ainda). Quando fomos ouvir o resultado, eu queria regravar a voz a qualquer custo (tinha sido muito fácil), mas todos acabaram me convencendo de que estava bom.
- A voz de “A Face do Destruidor” foi gravada em cima da base tocada de trás pra frente. Quando gravamos tínhamos que pensar que aquilo ia ser ouvido dessa maneira.
- O Tony fez todos os solos importantes do disco usando uma técnica no mínimo curiosa: revezava um anel grande que ele tinha na mão direita com a palheta para tocar e, ao mesmo tempo, tirar efeitos percussivos da guitarra. Isso funcionava também como uma espécie de ‘bottle neck’ e acabou dando uma cara diferente para os solos que ele fez."
São 13 faixas ao todo e todas elas tem estridência esteticamente escatológicas e furiosas.Vou contar aqui com minhas palavras sobre cada uma delas.
Cabeça Dinossauro - Feita sob medida para o disco.Os Titãs tinham voltado de uma turnê e Paulo Miklos,estava com uma ressaca fodida e começou a dar a idéia esboçando a letra,começando,por cabeça dinossauro e o Branco escreve seguidamente "Barriga de elefante" e o Arnaldo pra fechar pôs "Espírito de Porco".Mas ela foi feita mais para afugentar os maus espíritos dos índios do Xingu.
AA - UU - Feita na casa do Marcelo Fromer com o Britto.A letra é praticamente é uma gritaria,não quer dizer nada,é só aquilo.Marcelo e o Britto terminaram a letra e a música em quase uma hora.Ela fala do cotidiano pessoal,mostrando a indignação.
Igreja - Pra ser mais exato,essa música quase que não entra,por sorte,entrou.Na época,o Arnaldo estava preso por porte de heroína,junto com o Tony,que pagou a fiança e saiu.O Nando,que eu não sabia que era ateu,fez a música e a letra de "Igreja",mas ela causou estranhamento entre Arnaldo e ele,por Arnaldo acreditar em Deus,e Nando ser ateu declarado.Tanto é que nos shows,na época,se você parasse pra ouvir a música,não conseguiria ouvir nos coros a voz do Arnaldo.
Polícia - Do Tony Bellotto.O Tony fez a melodia e a letra sobre a polícia,sendo corrupta ou honesta,falando sobre a omissão e corrupção da PM convencional.
Estado Violência - A única do baterista Charles Gavin.Uma polaroide,como ele mesmo descreve.Quem canta a música é o Paulo Miklos.
A Face do Destruidor - Essa faixa é a mais curta de todas,trinta e oito segundos.Feita pelo Miklos e o Arnaldo,sobre a destruição que o homem causa,sobre aquilo que construímos,poderia ser roubando ou de outra forma.
Porrada - Feito pelo Arnaldo Antunes e o Britto.Ela contesta por um lado e felicita,quase que uma canção em cima do muro.Ela parabeniza o Presidente da República e outros trabalhadores de outras organizações,mas cai de pau em cima da vagabundagem.
Tô cansado - Feita sob medida sobre cansaço de modo geral.O Branco e o Arnaldo têm essa facilidade,escrever sobre cansaço de moralismo barato.
Bichos Escrotos - A única que fôra "expressamente proibida" de tocar nas rádios por causa do "Vão se foder" e vetada de modo geral.Naquela época era proibida a leitura da canção,pois a ditadura ainda pegava no pé de quem escrevia canções com palavrões,só que a banda tava cagando e andando pra esta porra e mesmo assim,colocaram no disco.Foi feita em 1983,com o Arnaldo,o Britto e o Nando Reis que assim que acabaram de escrever,foram na casa do Paulo,fazer uma serenata aos berros...Lembro até que a primeira levada da música era bem devagar,com os violões e a voz calminha,pra depois passar pra extensão pesada.
Família - Por pouco,essa fica de fora também,mas se tratando do cotidiano e de problema social sobre a família,acabou entrando no contexto com uma levada reggae e mais pop possível.Quem canta é o Nando Reis.Praticamente um poema do Arnaldo Antunes sobre a batuta do Bellotto nas guitarras,assinando a melodia.
Homem Primata - A princípio,era pra ser gravada pelo Lulu,mas como ele desistiu,devido a insatisfação que os Titãs tiveram em relação a produção do segundo disco,acabou que só a banda gravou.Ela fala sobre a burrice constante do homem que invés de ficar quieto na dele,saiu jogando tudo fora,destruindo tudo que vê pela frente.Em relação a "capitalismo selvagem",a história pra mim bateu certinho,porque lembra dos ladrões de almas nas igrejas neo pentecostais,tais como Edir Macedo e R.R Soares e sua trupe maldita que tira o dinheiro do povo pra erguer mais um templinho e sair roubando muito mais.É igual o homem das cavernas mais filhas da puta que ja vi nesse planeta,que invés de tratar a mulher com carinho,sai espancando.
Dívidas - Outra parceria ou combinação Branco - Arnaldo,falando sobre falta de grana,pagamentos,impostos,dívidas em relação a impréstimos.Também tem a ver com capitalismo.Dá pra notar.
O quê - A última do disco que abriu portas pra mais um trabalho que viria em 1987.Ela foi feita pelo Arnaldo praticamente sozinho,numa levada diferente,no violão em um acorde só.Aí a primeira vez,na época da gravação não caiu bem,aí depois,o Arnaldo pensou e fez com outra levada e ai sim,gravaram a música que realmente também não quer dizer nada.Era só "Que não é o que pode ser que não" e ficava diversas vezes repetindo a mesma coisa,só que com um tom mais bruto,indignado.O arranjo da música ficou por conta do Liminha com os Titãs.O Liminha até tocou guitarra e sugeriu ao Charles a usar bateria eletrônica invés da bateria convencional.Acabou ai e os Titãs prosseguiu com o Lima e gravaram "Jesus Não Tem Dentes No País dos Banguelas" em 1987,usando da mesma levada eletrônica de um lado e a continuação mais pesada do outro e assim vai.
A capa e contracapa do disco foi uma sugestão do membro Sérgio Britto (voz e teclado),pra dar mais força e teor ao disco.Foi cedida do Museu do Louvre,de París (França) e são obras do pintor italiano Leonardo Da Vinci...
Na Integra vocês verão a história do disco relatada pelos caras da banda...com a participação dos produtores (Liminha e Peninha) e de ex membros (Nando e Arnaldo)
Bem amigos...com a comemoração de 30 anos da banda mais escatológica do rock nacional,Titãs,eu resolvi experimentar a divulgação dessa turnê "Cabeça Dinossauro" fazendo um blog sobre não só para comemorar 30 anos,mas também para falar sobre o disco mais furioso,escatológico,feroz e contestador da banda...